quarta-feira, janeiro 30, 2008

a cisterna

ou barril. ou pote. ou cuba.
ou vasilha. ou pipa. ou alguidar.

depende de quem lá nasce. no alguidar.
têm aproximadamente 80 anos de altura, e tal.
mais ano menos coisa. depende de quem lá vive, bem ou mal.

vão enchendo. ora de água, ora de mel,
ora de azeite, de vinagre e fel.
de vinho e bílis, de amor e aguardente,
de ódio e sangria, de tristeza e chá quente.

e quem lá nasce, vive lá para sempre.
lá dentro, mais para dentro, cheio e quente.
sempre com menos ar de gente.

depois, depende do peso que se tem.
há quem engorde com os anos, mais coisa menos mal.
quanto mais gordo mais fundo, pior. mais água menos ar.
quanto mais leve melhor, para boiar. mais ar, mais ar.

e assim vão indo, mais ano menos mal.
todos sem tirar nem por, cada um no seu barril,
pote, pipa, cova, sepultura ou alguidar.
mais anos menos coisa, menos ar.

ginásio e treinador. perder peso para flutuar.
beber vinho e fumar, sair na segunda à esquerda para o mar.
afogar-te na tua cuba, filho da puta, menos mal.

e as lágrimas? também contam para afogar?
e rimar? esta merda de letras umas nas outras, umas nas outras.
umas que se põem nas outras, para me afrontar.
quem as tira aqui de dentro, da cuba, da cisterna, do meu mal?

tenho tanto peso nas pernas, na barriga das pernas.
na barriga da barriga do coração da cabeça da alma.
tenho tanto peso que não chego ao cimo. ao ar.
gordo da merda, cheio dela, mal a vês para mijar.
para dentro da tua cuba, para te queimar.

oitenta e tal metros, mais ano menos ar.
de madeira de carvalho, com aguardente antes de fermentar.
rima, rima, rima, ri-te desta rima, antes de a acabar.
a pipa está cheia, acabas-te com ela, peso a mais para a levantar.

a rolha de cortiça é que é boa.
fim.

2 comentários:

Unknown disse...

tocaste-me, visceralmente.

O Despachante disse...

Assim me arrancaste a bílis e assim vamos "indo, mais ano menos mal."